quarta-feira, 14 de maio de 2014

A VERGONHA

Esta noite eu tive a mais constrangedora experiência da minha vida de pai. Pela primeira vez, desde que Gabriela começou a passar por esse procedimento, eu fiz a sondagem completa para retirar a urina dela. E olha que eu fugi dessa tarefa, evitei ao máximo, no máximo manipulei a seringa, sem passar pela etapa da assepsia e introdução da sonda. Foi uma avalanche de sentimentos contraditórios, principalmente impotência, medo, gratidão e cobrança.

IMPOTÊNCIA, por não ser capaz de entender racionalmente o motivo de estar fazendo aquilo e, ao mesmo tempo, se culpar por nunca ter tido coragem de tomar o lugar da minha esposa nessa tarefa tão rotineira para ela.

MEDO, pois me sentia invadindo a privacidade da minha filha. Tenho consciência que estava mais apavorado que Gabriela, pois o procedimento já faz parte da rotina dela, mas ainda não consigo racionalizar completamente isso. Tinha medo também por saber que aquela não seria a última vez e nem saber quando essa vez iria chegar. Tenho medo também do fantasma da infecção urinária, tanto por ser relapso na higiene como por não conseguir esvaziar a bexiguinha dela.

GRATIDÃO, por ter ainda meu lado uma grande mulher, uma verdadeira guerreira como a Letícia, de personalidade forte, inclusive tenho certeza que Gabriela herdou dela o seu grandioso espírito de luta.

COBRANÇA, por demorar tanto para realmente ajudar a minha companheira, minha parceira, meu aconchego nos momentos de fraqueza, minha guerreira de tantas batalhas que já se passaram e de tantas outras que ainda virão.

Peço desculpas por quebrar a linha cronológica da história da minha Gabriela, mas eu precisava externar o que eu estou sentindo, pois se deixasse para depois, não conseguiria transmitir tão verdadeiramente a angústia que estou sentindo agora.

Eu nem sei dizer se é vitória ou  derrota, sinto que está mais para PEQUENA VERGONHA do pai da Gabriela.

quinta-feira, 1 de maio de 2014

O SUSTO - parte 2, a reação

A notícia não era nada boa, não só pelo diagnóstico, mas também por não sabermos quais as sequelas da má formação, sabíamos apenas que ela precisava fazer, pelo menos, duas cirurgias, uma para o fechamento da lesão e a segunda para "resolver" a hidrocefalia. Nosso maior medo na época eram as sequelas neurológicas e motoras, pois com a formação da coluna e a consequente ação do liquor, além dos riscos decorrentes das duas cirurgias, todas envolvendo nervos e em áreas delicadas, sequelas graves seriam possíveis.

Após a consulta, uma avalanche de sentimentos passou pela cabeça e pelo coração, principalmente revolta e culpa por não sermos capazes de gerar uma criança "perfeita".

Esse tipo de reação, num primeiro momento poderia ser esperado, mas muitos não entenderam, pois como qualquer ser humano, somos passíveis de fraqueza. Inclusive nosso tio, tempos depois, nos cobrou uma atitude mais madura, com menos revolta, menos lamento, sem compreender que aquele era apenas um momento em que fraquejamos.

Passado o susto,  eu e a Letícia decidimos encarar o que Deus e a vida gostariam de nos ensinar. Era óbvio que estávamos apavorados, mas não adiantava ficarmos focados com situações sem modificação durante a gravidez. Tínhamos que aceitar a tarefa de sermos pais da GABRIELA com todo o peso da função. Hoje, olhando para trás, temos certeza que tudo foi apenas para o nosso amadurecimento. Como algumas vezes ouvimos: "Deus não dá uma missão para alguém que ele não acredita francamente na sua capacidade de realização".

Essa foi a terceira PEQUENA VITÓRIA da Gabriela e uma GRANDIOSA VITÓRIA do Edison e da Letícia